O termo "rito" deriva do latim ritus, que designa um culto, uma cerimónia religiosa, mas também, num sentido mais amplo, um uso, um costume; os rituais podem ser religiosos (como a missa ou o sabbath); seculares (como o protocolo ou o juramento dos jurados); colectivos (como as festividades nacionais ou familiares); ou privados (como a oração interior ou certos ritos corporais). Outros ritos dizem respeito à nossa vida diária (como o cumprimento, a cortesia) ou a práticas relacionadas com a magia, e que ainda persistem em determinadas regiões.
noções adjacentes ao ritual:
- costumes, rotina: verificamos que o rito se reduz a certos usos ou segmentos de conduta que se revestem de um carácter rotineiro e estereotipado: quando falamos, por exemplo, de rituais administrativos ou pedagógicos, para que a tónica recaia em aspectos formais e processuais aparentemente prescritos; estes processos dizem respeito a um ciclo de operações que não se reduz a um programa nem a um hábito - referem-se a certos valores, por vezes contestados, mas ainda amplamente perenes. Assim, a utilidade extensiva do termo continua dotada de um halo de sentido e de símbolo irredutível à simples utilidade.
- código, programa: um código é um sistema de sinais que, mercê de uma convenção prévia, se destina a transmitir uma mensagem de um emissor para um receptor. Os sinais podem ser de natureza diversa: linguísticos, gestuais e mecânicos; a escolha do registo depende simultaneamente da finalidade da comunicação (informar, inquietar, seduzir, etc) e do contexto (habitual ou conjuntural). Certos códigos são susceptíveis de ritualização, nomeadamente no campo religioso e mágico, mas também jurídico e até mundano.
- cerimónia, culto: a expressão cerimónia está ligada a todas a formas ou aspectos de práticas colectivas fortemente organizadas, ou até mesmo teatralizadas: toda a cerimónia refere-se a um rito fundador que deverá conter uma encenação mais ou menos cerimonial (como por exemplo o caso do casamento ou das exéquias).
- rito e símbolo: ao nível da linguagem corrente se diz, por exemplo, que o anel, a bandeira e a cruz são respectivamente os símbolos do casamento, da prática e de cristo; que o cão simboliza a fidelidade e a serpente a perfídia. A arte, a poesia, e a religião recorrem a símbolos. Em todo o caso, é algo que se encontra ausente na nossa percepção imediata e que é representado, figurado, pelo objecto simbólico. Este estabelece um vínculo com o invisível e acciona o imaginário. As práticas são eminentemente simbólicas, uma vez que mediatizam por meio de atitudes, de gestos ou palavras, uma relação com uma entidade não só ausente (como sucede com o simples sinal), mas impossível de perceber, inacessível a não ser por intermédio do próprio símbolo.
funções dos rituais:
- função de contenção da mutação e de segurança contra a angústia: as condutas rituais exprimem e liberam a inquietude humana perante a corporação e o mundo, a sua transformação e o seu aniquilamento. Elas permitem que sejam canalizadas emoções poderosas como o ódio, o medo, o desgosto, a esperança - esta função é particularmente evidente nos rituais de luto, bem como em certos ritos de iniciação ou de cuidados corporais.
- função de mediação com o divino ou com certas formas e valores ocultos ou ideais: esta função está directamente relacionada com a anterior, uma vez que tende a conciliar-se com poderes que nos escapam: divindades, espíritos maléficos ou benéficos, ideais aleatórios. Perante aquilo que não é tecnicamente acessível e controlável, o homem recorre a operações simbólicas: gestos, sinais, objectos figurativos a que atribui certa eficácia; é esse o sentido das orações, das fórmulas magicas - a referência a algo de sagrado subsiste nos rituais laicos e seculares sob a forma de valores e de ideais aos quais são consentidos sacrifícios, testemunhos de respeito ou até mesmo encantamentos.
- função de comunicação e de regulação: mediante o atestado e o reforço do vínculo social; qualquer comunidade (extensa ou restrita), qualquer grupo que partilhe um sentimento de identidade colectiva (bem expresso pelo uso do pronome "nós") experimenta a necessidade de manter e reforçar as crenças e os sentimentos que fundamentam a sua unidade. Esta espécie de reconstrução moral, apenas poderá ser obtida por meio de reuniões, de congregações em que os indivíduos, estreitamente aproximados uns dos outros, reafirmam juntos os seus valores comuns - é o que acontece em todas as festividades religiosas ou laicas, em todos os ritos de massas (manifestações, jogos importantes), e até em certos rituais mais quotidianos (como as formas de cortesia, as preocupações com a postura, etc).
magia e religião:
O mana não é simplesmente uma força, um ser: é também uma acção, uma qualidade e um estado; o termo é simultâneamente um substantivo, um adjectivo e um verbo. Diz-se que um objecto é maná; que um ser ou um rito possuem maná. Esta noção ampla pode alargar-se a todos os ritos mágicos e religiosos, aos espíritos, às pessoas e aos objectos que intervêm em todos os acontecimentos da vida: "é ele que faz com que a rede prenda, com que a casa seja sólida, com que a canoa se faça ao mar... a ele se deve a fecundidade de um campo, a virtude de um medicamento, a fatalidade de uma seta."
ritos, mímese e violência, segundo René Girard:
A mimése (que designa a imitação no sentido absoluto) é simultâneamente, a causa de toda a aprendizagem e de toda a rivalidade, força de coesão e de dissolução; temida por uns, que lhe presentem os riscos, desdenhada por outros, que reduzem o seu alcance aos comportamentos conformistas e de aparência. Todos os rituais visam finalmente expulsar o "malefício", graças a operações cada vez mais simbólicas, passando dos ritos mágico-religiosos para ritos teatrais ou terapêuticos. A tragédia grega ocupa um lugar eminente entre a ordem religiosa arcaica e uma ordem estatal mais moderna. Em vez de substituirmos a violência colectiva original por um templo e um altar no qual será realmente imolada uma vítima, temos então um teatro e um palco em que o destino de um herói mimado por actor grego, purgará os espectadores das suas paixões e provocará uma nova catarsis individual e colectiva igualmente salutar para a comunidade. No sistema judicial, a pena de morte situa-se directamente no prolongamento ritual da violência instituidora: ela funciona como a libertação purificadora do grupo. O mesmo se passa com o exílio e, mais recentemente, com a interdição de permanência ou com a repressão nas fronteiras.
Andy Warhol, Electric Chairs (1 de 14) |